sábado, dezembro 22, 2007

Meu primeiro conto: "15 segundos"

Caminhava eu naquela manhã de sol, muito calmamente, feliz por estar bem, mas triste porque não tinha uma boa namorada. Neste mesmo instante, um homem negro, caminhando pela estreitas, e tristes vias de sua favela, abordando a mulher do seu vizinho (nas costas dele, a vista de todos seus filhos e parentes) acaricia o seio direito da mulher dele. Quando os demais exceto seu vizinho cochicham que ele iria ver e que este era perigoso, ele retruca:

- Esquece! Eu estou invisível!

E todos respeitam seu argumento. Quando o vizinho, marginal conhecido e perigoso se vira ele diz:

- Fala ai, meu irmão? Tudo beleza pura? Você está ótimo...

E na mesma hora ele se dá conta de uma alegria enorme pelo “irmão” que lhe dirige aquelas palavras... E bate no seu ombro, um tapinha de consideração... E nada mais acontece...

Este homem sai pela cidade e vai direto a um pronto-socorro. Pois quer ajudar alguém. Entra na primeira sala aberta, e encontra na cama uma simpática mocinha. E lhe pergunta:

- O que você tem?
- Eu tenho amebíase...
- Então, a partir de hoje, você vai se cuidar... Não vai mais, se contaminar, e não vai sofrer mais com esta doença. Vai ficar boa, e vai viver melhor!

Uma nova cor apareceu no semblante da mocinha que só pôde dizer:
- Obrigada, moço! Já me sinto até melhor...

E ele vai fazendo as mesmas coisas em todas as alas do hospital que encontra aberta.Depois vai para a rua.

No meu caminhar, pelo bairro de classe média, um rapaz mulato, saído do nada, pula na minha frente e me aponta uma arma prateada, tentando me assaltar. Neste mesmo instante o homem negro que saía de um hospital, nos aborda, surpreendendo a mim e ao mulato:

- Irmão – retirando a arma das mãos do mulato, e falando – essa arma não é pra você irmão – e vai retirando as balas da arma ...

Atônito o assaltante mulato deixa o homem, e eu, perplexos. Até nos dizer, junto aos ouvidos:

- Faça as coisas, e fale as coisas certas. Mas só com o seu coração. E elas te darão um poder incrível! O poder de convencer com as palavras. Mas só não esqueça de uma coisa: escolha as palavras certas, meus amigos... Porque este poder só dura 15 segundos...

Naquele momento, a vizinhança em que me encontrava, percebendo esta arma, ainda na mão daquele bom homem - que desarmava o mulato - já comentavam que era um assalto da “dupla” de homens de cor... E já havia até um burburinho falando do assalto.

O homem negro, então fez um gesto geral largando a arma no chão. E disse:

- Não é nenhum assalto. É só uma brincadeirinha gente! E de mentirinha gente! É ensaio de teatro ... Somos todos atores!

Todos suspiraram aliviados e até acenaram para o negro com amabilidades de velhos amigos.

Sai dali atônito e fui cambaleando para outras ruas. Numa delas havia um grupo de cinema gravando uma cena de um filme.

Por impulso fui adentrado o set de filmagem e fui dizendo para os auxiliares:

- Faço parte da equipe! – com um sorriso no rosto.

E todos me abriram caminho até o set. Me coloquei na lateral do diretor de filmagens e cochichei no seu ouvido que fazia parte da figuração:

- Cheguei atrasado, mas ainda dá tempo de me incluir na filmagem...

Na mesma hora o diretor interrompe a cena:

- Corta! – e diz – incluam este figurante no grupo.

E em seguida grita:

- Gravando!

Depois da cena um outro senhor e sua filha que assistiam, na rua, a cena, me pergunta como eu consegui entrar na última cena do filme, e ser filmado tão rapidamente. E eu lhe disse:

- Todos temos um poder... Se falarmos as palavras certas, com vontade de que se realizem. Sem medo e com o coração limpo, querendo ajudar o próximo... elas se realizam ... Mas este poder só dura 15 segundos...

- Como é que pode? Pode fazer uma demonstração?

Naquele momento percebi a beleza de sua filha. Como gostaria de ter uma namorada como ela. Ela ouvia atentamente todas as minhas palavras. Ela e o pai tinham os cabelos longos até os ombros, porem manchados de tinturas. Tinham mechas pretas e alouradas... Então falei:

- Veja só! Seus cabelos – dirigindo-me a sua filha – ficarão totalmente louros, como sempre quis. E da forma que sempre quis.

Na mesma hora, como um milagre, minhas palavras surtiram um efeito físico maior do que o do homem negro, que me ensinou tudo. Falei com a minha vontade de que se realizasse, e com a maior devoção de que fosse bom somente para a pessoa em questão...

- A moça olhou seu reflexo no espelho de uma vitrine, ficando totalmente agradecida. E veio me abraçar e me beijou o rosto várias vezes (eu por mim adorei, pois queria tanto ter algum tipo relacionamento com aquela moça linda, que achei que já era um bom começo).

- Seu pai falou que se sua filha estava feliz, ele ficava feliz também. E eu lhe disse:

- Seus cabelos irão ficar iguais ao do Rod Stewart. A cor vai ficar equilibrada e você vai ficar satisfeito...

Ele também se olhou no espelho da vitrine e ficou satisfeitíssimo. Disse-me que eu havia dado uma boa prova do que eu falava. Deu-me um abraço e convidou-me a almoçar com ele e sua filha. Sua filha já me tratava como um grande amigo e seu pai como um velho amigo.

Enquanto eu caminhava com eles eu pensava, como era possível? As palavras ditas com vontade podiam fazer estes milagres!. Visto que somente eles notaram a diferença em seus cabelos. Para mim tudo continuava igual... Pelo menos aparentemente... O efeito era feito na nossa alma....

Nossas palavras têm efeitos de 15 minutos, nas mentes e nos corações das pessoas, se falamos com o nosso coração.

É uma mensagem de coração para coração. E estas palavras mudaram a realidade de: um favelado, de vários doentes em um hospital, de um assaltante, de vizinhos assustados de um bairro, de um diretor de cinema, de um popular e sua filha e a minha própria realidade...

Será possível que as palavras, ao invés de ofenderem religiões e governos, um dia fossem usadas para equilíbrio também?. E que toda guerra fosse feita no mundo das palavras e nunca com as mãos armadas?. Que as guerras de palavras fossem somente para discutir-se as idéias e consensos, nunca para a agressão da palavra contra a palavra?.

Se podemos somar, para que dividir?


Copyright: Marcelo Guimarães dos Santos

P.S. - O artista plástico americano Andy Warhol (que fez sucesso na década de 60 com a Pop Art), muito à frente de sua época, foi o autor da frase: -"No futuro, todos terão direito a 15 minutos de fama”, já prevendo a era da reprodutibilidade técnica e da efemeridade da arte.

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